“Alegra-te”

Quando o anjo Gabriel vem saudar-te em Nazaré, a primeira palavra que te dirige, ó Maria, é uma palavra de alegria: “Alegra-te!” (1). Antes mesmo de te comunicar sua mensagem, ele pede, da parte de Deus, que entregues tua alma á alegria. Convida a te regozijares, não só em teu nome, mas no de toda a humanidade, pois, nesse momento da Anunciação, teu coração representa o nosso; deve encher-se de alegria para que o nosso, por sua vez, seja invadido pela mesma alegria.

Assim aprendemos, por esse convite do anjo, que Deus quer, acima de tudo, a nossa alegria. É sua intenção tornar-nos felizes; seu primeiro cuidado para contigo foi o de tornar-se plenamente feliz. Somo tantas vezes inclinados a temer a intervenção de Deus na nossa vida, como se essa intervenção fosse uma ameaça á nossa felicidade; e eis que o anjo nos faz saber, como a ti, que o Senhor não tem desejo mais instante do que ver as almas desabrocharem na alegria.

É certo que a mensagem que vais ouvir nesse momento da Anunciação arrastar-te-á a um número bem grande de provações e te conduzirá até o pé da Cruz. Mas ela te concede muito mais alegria do que sofrimento. E, em troca de sofrimentos passageiros, assegura-te uma alegria definitiva. Conforme a vontade de Deus, a alegria é destinada a perdurar e a dor a ser efêmera.

Essa alegria que Deus quer conceder-te, ele já a havia preparado há muito tempo. Muitas vezes pelos profetas, pedira que o povo judeu se alegrasse por causa da salvação que haveria de vir. “Exulta de alegria, filha de Sião! Solta gritos de júbilo , filha de Jerusalém! Eis que vem a ti o teu Rei...” (2). Esta palavra profética agora se realiza: exultas, em nome de todo o povo, em tua humilde casa de Nazaré, porque aquele que é teu rei vem a ti para ser teu filho. Esta alegria que agora é tua, te é dada por Deus tanto mais copiosamente quanto mais longamente esteve retida por ele.


A plenitude da alegria deve ser realizada em ti. Tudo o que houve de alegria, outrora, no povo judeu, por causa da promessa do Messias, atinge em teu coração o ponto culminante. Desde o começo da história, jamais fora dada tão grande alegria a uma criatura. Todo o Antigo Testamento existiu para te obter suprema alegria. E se Deus não te pede expressamente, como á filha de Sião, que soltes gritos de alegria, quer, no entanto, que tua alegria seja a mais viva, a mais intensa que um ser humano possa experimentar na terra.

Alegra-te, pois, em nosso nome, e já que esta alegria te é dada para que a difundas, faze com que partilhemos dela na mesma medida. O mundo atual não é menos faminto de alegria do que o mundo que te cercava em Nazaré. Não se sente o homem criado para a felicidade? Ora, a felicidade frequentemente lhe dá a impressão de uma realidade maravilhosa que, embora o atraia, dele foge constantemente. Ser feliz é seu sonho e isso lhe parece também uma impossibilidade. Mas tu, Maria, desde que o anjo te disse: “Alegra-te!”, conservas o segredo em teu poder, e, em ti, o sonho se tornou realidade.

Que fizeste para ficar repleta de felicidade? Abriste simplesmente tua alma ao amor divino que te queria cumular. Não tentaste tomar a felicidade á força, não te atiraste a toda espécie de prazer e não procuraste a alegria superficial daqueles que desejam atordoar-se. Tu te limitasse a acolher a alegria que Deus te enviava. Porque esperaste só de Deus a felicidade, dele a recebeste em plenitude.

Faze-me ver mais claramente que só devemos procurar a alegria que vem de Deus, pois é a única verdadeira. O prazer dá apenas uma ilusão de felicidade; os que atrás dele correm, ficam invariavelmente decepcionados e tem a impressão de que a felicidade lhes está sempre fugindo. Querem apoderar-se dela onde não existe. A ambição e o dinheiro são incapazes de tornar o homem feliz. Quando somos tentados a esquecer isso, basta-nos olhar-te, jovem simples e pobre, desconhecida, inundada pela alegria divina na tua casa de Nazaré.

Comunica-nos este segredo de tua alegria. Tu nos ves tão frequentemente entregues á tristeza, oprimidos pelas preocupações. Nossas vidas são monopolizadas pelas inquietações e nelas perde a serenidade. Pouca coisa basta para nos perturbar e inquietar. E nossos dias muitas vezes se tornam pesados pelo cansaço, quando não pelo tédio. Dir-se-ia que nos esquecemos da alegria que Deus põe ao nosso alcance.  Não estamos bastante atentos para acolhe-la. Faze que, seguindo teu exemplo, nossas almas se abram inteiramente á alegria divina!

Já que traçaste para toda a humanidade o caminho da alegria, faze-nos segui-lo: é o caminho da intimidade com Deus. Ensinaste-nos que a felicidade vem do contato com o Senhor. A cada uma das almas que lhe estão unidas, Deus não se cansa de repetir o convite que te dirigiu: “Alegra-te!” Quanto mais perto de Deus, tanto mais perto da fonte da alegria.

Como Deus queria vir a ti, fez em ti surgir uma imensa fonte de alegria destinada a se difundir por sobre a humanidade. Com efeito, quanta alegria se espalhou pelo mundo desde a Anunciação! Como, nesse momento, o Cristo te foi confiado para daí irradiar-se em todo o universo, assim a alegria te foi dada para tornar-se, desde sua fonte, em Nazaré, um rio que arraste as existências humanas.

Quanta alegria emana, ainda hoje, de tua pessoa sobre todos os que amas! Pois a alegria que te foi concedida é inesgotável e não cessas de multiplica-la para nós. No espírito dos cristãos, o nome de Maria é sinônimo de uma felicidade escondida, mas veemente: para sempre serás o sinal da autentica alegria e a medianeira que nos comunica esta alegria.

Se Deus não te tivesse concebido, e se não existisse na religião católica a Virgem Maria, como tudo seria sombrio! Não teria havido ninguém para receber a alegria do Messias, vindo a este mundo, ninguém que se regozijasse em nome de todos nós. Felizmente, existe. Podemos contemplar-te, e ver, em teu rosto, a alegria trazida pelo anjo Gabriel. Seja-nos, pois, impossível olhar-te sem sermos iluminados por tua felicidade! Tu que fizeste a primeira provisão de alegria cristã, renova a daquelas que se colocam em tua presença! Tu que entregaste tua alma á felicidade, entregando-a a Deus, faze que, em nossa doação a Deus, nossa alegria seja completa!

Intenções para a recitação do Terço:

Virgem irradiante de alegria,
-faze-nos crer na felicidade que Deus, em seu amor, quer oferecer-nos;
-faze reflorescer a alegria nos corações entregues á tristeza;
-ensina-nos o desapego dos prazeres terrenos e a procurar nossa felicidade em Deus;
-ajuda-nos a levar ao nosso próximo o testemunho da alegria cristã;
-por tua presença em nossa vida, se para nós a fonte de uma alegria sempre nova!

Invocação

Nossa Senhora, que recebeste de Deus a mais profunda alegria, ajuda-nos a viver na alegria verdadeira, a alegria do Cristo!

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(1)    Luc. 1, 28. “Alegra-te” – Os judeus saudavam-se com o “chalóm” – Paz – e, provavelmente, a Virgem foi assim saudade pelo anjo.  S. Lucas, ao redigir o seu Evangelho em grego, transpôs a saudação hebraica para a usada entre os gregos: “Kaire” – Alegra-te – Os latinos cumprimentavam-se com o “Ave” e este foi o termo adotado pela Vulgata, conservado também na fórmula da Ave-Maria, em latim e português.

(2)    Zac. 9, 9

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