Suponhamos que uma mãe soubesse que dois filhos seus eram inimigos mortais, intentando um tirar a vida do outro. Em tal conjuntura não seria dever de toda boa mãe procurar encarecidamente como pacificá-los? Assim pergunta Conrado de Saxônia. Ora, Maria é Mãe de Jesus e Mãe dos homens. Aflige-se quando vê um pecador inimizado com Jesus e tudo faz por reconciliá-lo com seu divino Filho.
Do pecador só exige a benigníssima
Rainha que se recomende a ela e tenha o propósito de emendar-se. Em o vendo a
seus pés a implorar-lhe perdão, não olha para o peso de seus pecados, mas para
a intenção com que se apresenta. Se esta é boa, nem que o pobre haja cometido
todos os pecados do mundo, abraça-o e como terna Mãe não desdenha curar-lhe as
chagas que na alma traz. Pois é Mãe de Misericórdia, não só de nome, senão de
fato, e em verdade tal se mostra pela ternura e pelo amor com que nos socorre.
A própria Virgem Santíssima assim o revelou a S. Brígida. "Por mais culpado que seja um homem, disse-lhe, se vem a mim com
sincero arrependimento, estou sempre pronta a acolhê-lo. Não considero a
enormidade de suas faltas, mas tão somente as disposições do seu coração. Não
recuso ungir e curar as suas feridas, porque me chamo e realmente sou Mãe de
Misericórdia".
É Maria Mãe dos pecadores que se
querem converter. Como tal não pode deixar de compadecer-se deles. Parece até
que sente como próprios os males de seus pobres filhos. A cananéia, ao pedir
que o Senhor lhe livrasse a filha do demônio que a atormentava, disse-lhe:
Senhor, filho de Davi, tem compaixão de mim; minha filha está muito atormentada
do demônio (Mt 15, 22). Mas se a filha, e não a mãe, era atormentada do
demônio, parece que havia de dizer: Senhor, tem piedade de minha filha! Mas
não; ela disse: tem compaixão de mim e com muita razão. Pois sentem as mães como próprios os sofrimentos dos filhos. Ora, do
mesmo modo, disse Ricardo de S. Lourenço, pede Maria a Deus, quando intercede
por qualquer pecador que a ela recorre. Pede-lhe que dela se compadeça. Meu Senhor - parece dizer-lhe - esta pobre
alma, que está em pecado, é minha alma; por isso compadecei-vos não tanto dela,
como de mim, que sou sua mãe.
Oh! Prouvesse a Deus que todos os
pecadores recorressem a esta doce Mãe, porque todos certamente receberiam do
Senhor o perdão! - Ó Maria, exclama admirado Conrado de
Saxônia, tua acolhes maternalmente o pecador desprezado por todo mundo, nem o
abandonas antes que o hajas reconciliado com o juiz. Quer ele dizer:
Enquanto o pecador perseverar no seu pecado, é aborrecido e desprezado de todos;
até as criaturas insensíveis, o fogo, o ar, a terra, quereriam castigá-lo em
desafronta à honra do seu Criador ultrajado. Porém, se este pecador miserável
recorrer a Maria, expulsa-o Maria? Não; se vem com intenção de que o ajude, a
fim de emendar-se, ela o acolhe com maternal afeto. Não o deixa, sem primeiro,
com a sua poderosa intercessão, reconciliá-lo com Deus e o reconduzir à sua
graça.
No Segundo Livro dos Reis (14, 5)
lemos o que se deu com a sábia mulher de Técua. Disse ela a Davi: "Senhor,
tinha tua serva dois filhos; para minha desventura um matou o outro; e assim
perdi um filho. Quer agora a justiça tirar-me o outro, que é o único que me
fica. Tem compaixão desta pobre mãe e não permitas que eu perca ambos os
filhos". Então Davi, compadecendo-se da mãe, libertou o delinquente e lho
entregou. - O mesmo parece que diz Maria, quando vê a Deus irado com algum
pecador que a ela recorre. "Meu
Deus, lhe diz, eu tinha dois filhos, Jesus e o homem; o homem matou na cruz o
meu Jesus; agora a vossa justiça quer condenar o homem. Senhor, já morreu o meu
Jeus; tende compaixão de mim. Se eu perdi um, não me façais perder também o
outro filho". Certamente Deus não condena os pecadores que recorrem a
Maria e por quem ela intercede. Pois o próprio Deus recomendou os pecadores por
filhos de Maria. O devoto Landspérgio põe as seguintes palavras nos lábios do
Senhor: "Eu recomendei a Maria de aceitar por filhos os pecadores. Por
isso ela é toda desvelos para que, no desempenho de sua missão, não lhe
aconteça perder a nenhum dos que lhe foram entregues, principalmente quando a
invocam. E assim esforça-se o quanto pode em conduzir todos eles a mim".
Quem pode explicar, interroga
Blósio, a bondade e misericórdia, a fidelidade e a caridade com que esta nossa
Mãe procura salvar-nos, quando lhe pedimos que nos ajude? Prostremo-nos, pois,
diz S. Bernardo, diante desta boa Mãe; abracemo-nos a seus sagrados pés e não a
deixemos sem nos abençoar e sem nos receber por filhos seus. Nela esperarei, exclama S. Boaventura,
ainda que me dê a morte; e cheio de confiança desejo morrer perante uma de suas
imagens, e salvo estarei. Portanto, assim devem dizer todos os pecadores,
que recorrem a esta piedosa Mãe: Minha Senhora e minha Mãe, por minhas culpas
mereço ser repelido, e castigado por vós na proporção delas. Mas, ainda que me
rejeites e me tires a vida, não perderei nunca a confiança. E se tiver a
felicidade de morrer na presença de qualquer imagem vossa, recomendando-me à
vossa misericórdia, espero certamente que não me hei de perder, mas hei de
louvar-vos no céu em companhia de tantos que vos serviram e morreram invocando
vossa poderosa intercessão.
Leia-se o exemplo seguinte e veja-se
que nenhum pecador deve desconfiar da misericórdia e amor desta boa Mãe, se a
ela recorrer.
A Virgem Maria converte um jovem de vida desregrada que lhe implorou misericórdia
Esquil, jovem fidalgo, foi estudar em Hildesheim por ordem de seu
pai. Mas, em vez de estudar, entregou-se a excessos de devassidão. Depois disso
adoeceu seriamente, não lhe restando já esperança alguma de vida. Estando
próximo da morte, teve a seguinte visão: Viu-se dentro de um quarto cheio de
fogo e julgou que se achava no inferno. Pôde felizmente sair por um vão e
refugiar-se num grande palácio. Lá encontrou numa das salas a Santíssima
Virgem, que lhe disse: Temerário, como ousas apresentar-te diante de mim? Já e
já retira-te daqui e mete-te no fogo que muito bem mereceste! Nisso começa o
jovem a implorar a misericórdia de Maria, e pede a algumas pessoas ali
presentes que também o recomendem à Mãe de Deus. Elas atenderam-no, mas a
Santíssima Virgem respondeu-lhes: Este moço levou uma vida muito desregrada e
nunca me honrou com uma Ave-Maria sequer. Mas ele corrigir-se-á, amada Rainha,
observaram elas. E o jovem ajuntou logo esta promessa: Sim, eu o prometo; quero
corrigir-me e consagrar-me todo a vosso serviço, Senhora. Na mesma hora Maria
tornou-se meiga e disse-lhe com brandura: Bem; aceito a tua promessa; escaparás
da morte e do inferno
Após estas palavras terminou a visão. Voltando a si, Esquil
agradeceu à Mãe de Deus e a todos relatou o ocorrido. Levou daí em diante uma
vida santa, dedicou sempre especial devoção à Santíssima Virgem, e tornou-se
mais tarde arcebispo de Lund, na Suécia, onde converteu muitos para a verdadeira
fé. Já velho, renunciou ao arcebispado, entrando para a Ordem dos
Cistercienses, em
Claraval. Aí morreu na paz do Senhor, após quatro anos de
edificante vida. Alguns escritores colocaram-no na lista dos santos daquela
Ordem.
Oração
Mãe digníssima de meu Deus e Soberana minha, Maria, vendo-me tão
desprezível e carregado de pecados, não devia ter a ousadia de chegar-me a vós
e chamar-vos minha Mãe. Não quero, porém, que as minhas misérias me privem da
consolação e da confiança que sinto, dando-vos este doce nome. Verdade é que
mereço me rejeites, mas vos peço considereis o que fez e sofreu por mim o vosso
Filho Jesus. Depois rejeitai-me, se o podeis. Sou miserável pecador, mais do
que os outros ultrajei a majestade divina.
Ai! o mal está feito: a vós que o podeis remediar imploro agora:
Vinde em meu socorro, ó minha Mãe. Não me alegueis que não vos é possível
ajudar-me, porque sei que sois onipotente e do vosso Deus conseguis tudo quanto
desejais. Se me respondeis que não quereis socorrer-me, dizei-me ao menos a
quem me devo dirigir para ser consolado no excesso de minha angústia.
Apadrinhando-me com S. Anselmo, ouso dizer a vós e a vosso divino Filho: Ou
apiedai-vos de mim, dulcíssimo Redentor meu, perdoando-me, e vós, também, ó
minha Mãe, intercedendo em meu favor; ou, mostrai-me a quem devo recorrer, que
seja mais poderoso do que vós, e em quem eu possa confiar mais. Mas não; nem na
terra nem no céu posso achar quem tenha dos miseráveis mais compaixão que vós,
ou quem melhor passa ajudar-me. Vós, Jesus, sois o meu Pai; e vós, Maria, sois
a minha Mãe. Vós amais até aos mais miseráveis e ides à procura deles para
salvá-los. Eu sou um réu do inferno, o mais indigno de todos. Mas não é
necessário ir à minha procura, nem eu pretendo que o façais. Apresento-me
espontaneamente a vós, com esperança certa de que não me haveis de desamparar.
Aqui estou aos vossos pés, meu Jesus, perdoai-me. Maria, minha Mãe,
socorrei-me.
*Grifos meus.
(Livro: Glórias de Maria
- Santo Afonso Maria de Ligório)
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