Tão grande é o prestígio de uma mãe, que nunca pode
tornar-se súdita de seu filho, ainda que ele seja monarca e tenha domínio sobre
todas as pessoas do seu reino. É verdade, sentado agora à direita de Deus Pai,
no céu, reina Jesus e tem supremo domínio sobre todas as criaturas e também
sobre Maria. E o tem mesmo como homem, diz Santo Tomás, por causa da união
hipostática com a pessoa do Verbo. Todavia, é também certo que nosso Redentor,
quando vivia na terra, quis humilhar-se a ponto de ser submisso a Maria. “E
lhes estava sujeto” (Lc 2, 51). Sim,
desde que Jesus Cristo se dignou escolher Maria por Mãe, estava como Filho
realmente obrigado a obedecer-lhe, diz S. Ambrósio. Os outros santos –
reflete Ricardo de S. Lourenço – estavam unidos à vontade de Deus; mas teve
Maria maior ventura. Pois não só foi
submissa à vontade de Deus, mas também o Senhor se submeteu à sua vontade.
Das outras virgens diz-se que “seguem o Cordeiro por toda parte”. Porém de
Maria dizer se pode que o Cordeirinho de Deus a seguia, porque lhe foi
submisso.
Daí concluímos que são as súplicas de Maria eficacíssimas
para obterem tudo quanto ela pede, ainda que não possa dar ordens a seu Filho
no céu. Pois os seus rogos sempre são rogos de Mãe. Tem Maria o grande
privilégio de ser poderosíssima junto ao Filho, diz Conrado de Saxônia. E por
que? Justamente pela razão já apresentada, e que mais abaixo vamos examinar
minuciosamente: porque as súplicas de Maria são súplicas de Mãe. De onde as palavras de S. Pedro Damião: A
Virgem consegue quanto quer, no céu como na terra; até aos desesperados pode
dar esperança de salvação. O Santo chama o Redentor de altar de
misericórdia, onde os pecadores obtêm de Deus a graça do perdão. A ele, Jesus,
dirige-se Maria quando quer obter-nos alguma graça. O filho tanto aprecia,
porém, os rogos de sua Mãe e tanto deseja ser-lhe agradável, que sua
intercessão mais afigura uma ordem do que uma prece, e ela parece antes uma
Rainha do que uma serva, remata o Santo. Assim quer Jesus honrar sua querida
Mãe, que tanto o honrou em vida, prontamente concedendo-lhe tudo que pede ou
deseja. Belamente o exprime S. Germano nas suas palavras dirigidas à Virgem: Sois onipotente, ó Mãe de Deus, para salvar
os pecadores; não precisais de recomendação alguma junto a Deus, pois que sois
a Mãe da verdadeira vida.
Não receia S. Bernardino de Sena concordar com a sentença de
que “ao império de Maria todos estão
sujeitos, até o próprio Deus”. Isto é, Deus lhe atende os rogos como se foram
ordens. Exclama por isso Eádmero: Virgem, de tal modo vos elevou o Senhor,
que podeis obter para vossos servos todas as graças possíveis; pois é
onipotente vosso patrocínio, como assevera Cosmas de Jerusalém. Maria, sim, sois onipotente – acentua Ricardo
de S. Lourenço; pois que, conforme as leis, deve a rainha gozar dos mesmos
privilégios que o rei. Por isso, colocou Deus toda a Igreja não só sob o
patrocínio, senão também sob o império de Maria, observa S. Antonino.
Convindo, portanto à mãe o mesmo império que ao filho, com
razão Jesus, que e onipotente, tornou Maria toda poderosa. Contudo, sempre será
verdade que o Filho é onipotente por natureza e a Mãe o é por graça. E isto se
verifica, porque, quanto pede a Mãe, tudo lhe concede o Filho, como justamente
foi revelado a S. Brígida. Ouviu ela
Jesus dizer a Maria: Minha Mãe, já sabes quanto te quero; pede-me por isso o
que quiseres, porque, seja qual for a tua petição, não pode deixar de ser de
mim ouvida. E que bela razão alegou o Senhor! Minha Mãe, disse-lhe, nada me negavas na terra; é justo que nada eu te
negue no céu. Diz-se que Maria é onipotente; mas é do modo que se pode
entender de uma criatura, que não é capaz de atributo divino. Porque com seus
rogos obtém tudo quanto quer, é ela, pois, onipotente.
Com sobras de razão, portanto, ó excelsa advogada nossa, vos
diz S. Bernardo: Tudo se faz, se vós o
quereis. Basta a vossa vontade para que tudo se faça. Quereis elevar a uma alta
santidade o mais abjeto dos pecadores? Em vossa vontade está o fazê-lo. De
Eádmero são estas palavras: Senhora, basta-vos querer a nossa salvação e nós
não podemos perecer. S. Alberto Magno põe na boca de Maria palavras
semelhantes: Devo ser rogada, para que queira; porque o que eu quero é
necessário que se faça.
(Glórias de Maria – Santo Afonso Maria de Ligório)
*Grifos meus.
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